Em janeiro do ano seguinte recomeça a choradeira dos aumentos, devem querer deixar o patrão pobre como eles.
É Suposto Ser Humor
Nada mais original que criar um blogue em 2021
quinta-feira, 28 de setembro de 2023
Pobres
quinta-feira, 24 de agosto de 2023
Revolução Científica (versão oficial)
Na ciência acontece muitas vezes que os cientistas dizem: "Sabes, é um argumento muito bom; a minha posição está enganada”, e depois mudam de ideias e nunca mais se ouve aquela visão antiga deles. Fazem-no mesmo. Não acontece com frequência, porque os cientistas são humanos e a mudança às vezes é dolorosa. Mas acontece todos os dias. Não me lembro da última vez que algo assim aconteceu na política ou na religião.[1][Tradução livre]
domingo, 22 de agosto de 2021
Afeganistão
Neste momento a
maior preocupação da direita são os direitos das mulheres afegãs. Estou com
eles, gostava que o Afeganistão caminhasse para uma sociedade mais igualitária,
que surgissem algumas heroínas e que elas levassem a cabo uma mudança radical
dos costumes daquelas bandas. Até gostava de ouvir algumas delas, daqui a uns
40 anos, a dizer coisas que que não se coadunam de modo nenhum com a sua
história de vida. Depois seriam metaforicamente apedrejadas no Twitter por
aquelas que lhes devem a liberdade, o que, convenhamos, é melhor que apedrejamento
literal. Na semana seguinte o tema seria outro.
Mas nada disso
vai acontecer porque, apesar de existirem sim algumas heroínas afegãs, elas não
têm meios para operar o milagre. Esperemos que sobrevivam para pelo menos
plantar umas sementes de liberdade no deserto afegão, como fez o doutor
Nakamura.
Contudo, devo
lembrar que os EUA não foram ao Afeganistão entregar a democracia nem defender
as mulheres afegãs. Oficialmente foram combater o terrorismo. E falharam. 20
anos e 1 000 000 000 000 de dólares depois, as tropas americanas saem do
Afeganistão para o deixar entregue aos mesmos que lá estavam antes. Ou seja,
mais valia estar quietinhos.
Fica a lição aos
americanos: evitar ao máximo as intervenções em países estrangeiros. Senão
depois ainda vos pedem contas sobre defesa de direitos humanos. Não foram lá
fazer nada disso, mas também não querem desiludir quem vos tem em tão boa
conta.
quinta-feira, 19 de agosto de 2021
TANTOS DESCONTOS!
Se há coisa que
me deixa perplexo é ouvir pessoas que se queixam que descontam muito dinheiro
no ordenado. “Não sei se vale a pena trabalhar aquelas horas-extra, vai tudo
para descontos.”; “Vou receber um aumento, mas a maior parte vai para
descontos.” Às vezes também me informam que descontam imenso dinheiro, para
indiretamente me dizerem que ganham bem. Gosto.
O que ninguém me
diz é que está disposto a prescindir do seu direito a baixa médica remunerada,
a subsídio de desemprego e à pensão de reforma, para poder poupar os 11% de
desconto da segurança social. Aliás, em bom rigor, teria de dizer que está
disposto a sustentar os avós que ficariam sem a reforma que já têm. Devia ficar
mais barato, certamente.
Os descontos
para IRS, que faz todo aquele que ganhe um pouquinho mais que o ordenado
mínimo, também são um ultraje já que servem apenas para financiar tudo aquilo
que distingue a civilização da selva. Juntamente com o IVA e alguns outros
impostos, taxas e taxinhas, o imposto sobre o rendimento serve para pagar
escolas, hospitais, polícia, tribunais, obras públicas, etc, etc, – tudo coisas
que eu poderia pagar do meu bolso se não descontasse tanto dinheiro no fim do
mês.
O que é mais
maravilhoso ainda é que eu não ouço ninguém dizer que pagou muito IVA ao
comprar o novo telemóvel. Isso é muito engraçado porque o imposto sobre o
consumo (IVA) é muito mais injusto que o imposto sobre o rendimento. Se no IRS
paga uma taxa mais elevada quem ganha mais, no IVA pagamos todos a mesma taxa.
Será que custa mais ao Jorge Jesus (que ganha €4 milhões/ano) pagar 48% de
imposto em sede de IRS, ou ao Sr. Benjamim (que ganha €25 mil/ano) que é
professor e paga 37%? No IVA o JJ e o Sr. Benjamim pagam o mesmo, deve ser mais
justo. (Sim, eu sei que as taxas que apresento são as marginais.)
Reconheço que
Portugal tem enormes injustiças na cobrança de impostos, desde logo um nível
demasiado elevado de imposto para rendimentos médios, mas isso não é motivo
para diabolizar uma coisa que é indispensável a quem queira viver num país
digno e decente – um sistema progressivo de redistribuição de rendimento. O
sistema não é perfeito, mas tem funções imprescindíveis e pode ser reformado
(sim, nem todas as reformas estruturais precisam de ser para privatizar
serviços públicos). Por exemplo, a taxa liberatória para rendimentos do capital
(28%) é mais baixa que para certos rendimentos do trabalho, o que é moralmente
injusto e economicamente estúpido, isso deve ser alterado. Muita coisa deve ser
alterada.
Mas imaginemos
que se decide que a melhor maneira de tornar o sistema justo é acabar com os
malditos descontos no ordenado. Imaginemos um dia na vida do Sr. Benjamim nesse
admirável mundo novo.
Às sete da manhã
o Sr. Benjamim acorda cheio de energia, toma banho, come os cereais e enfia-se
no seu carro novo – comprou-o com o dinheiro que agora lhe sobra – em direção
à escola. Pelo caminho, o senhor Benjamim dá-se por satisfeito por ter
escolhido um todo-terreno, já que a estrada está cheia de buracos. Uns minutos
mais tarde, o senhor Benjamim repara que cada vez há mais carros na estrada, o
trânsito é insuportável e os transportes públicos são poucos e caros. “Malditos
políticos, o que fazem com o dinheiro dos meus impostos?”, diz o senhor
Benjamim, sem se lembrar que votou para acabar com os descontos. Até aqui tudo
normal.
Chegado à escola
(que agora é privada e, portanto, extremamente bem gerida), o professor recebe
a notícia que terão de dispensar a sua colaboração porque a
administração precisa cortar custos com pessoal para fazer obras no edifício.
Felizmente o senhor Benjamim é um homem prevenido e tinha feito um seguro de
desemprego, coisa muito mais barata que os 11% da segurança social, e nos
próximos 6 meses manterá algum rendimento.
Uma vez que
ficou subitamente com a agenda vazia, o professor Benjamim decide ir visitar os
pais. Uma vez em casa dos progenitores, estes lembram-lhe que ainda não lhes
deu a mesada este mês, ao contrário do irmão. Os anciãos precisam de
medicamentos e estes estão caríssimos desde que o Estado deixou de cobrar IRS - não se percebe. Perante a situação, o professor abstém-se de falar da sua
situação laboral, para não inquietar ainda mais os velhotes.
No resto do dia
o professor visita umas agências de emprego, vai ao supermercado e ao mediador
de seguros. Corre tudo dentro da normalidade e, surpreendentemente, o seguro de
desemprego cobria a sua situação de desemprego.
Ao chegar a
casa, depara com a porta arrombada e percebe que resta pouca coisa do recheio
da casa, felizmente a esposa e os filhos não estavam em casa na hora do
assalto. Assim que coloca as ideias no lugar, Benjamim liga à polícia que o
informa que, se ninguém está ferido, terão de registar a ocorrência por
telefone (contenção de despesa). “Malditos devem estar na esquadra a jogar às
cartas”, pensa o professor desempregado.
Foi um belo dia.
Olha, ao menos o Benjamim tem muito dinheirinho no bolso. E não precisou de ir
ao hospital.
Nesse dia o
Jorge Jesus não teve nenhum problema porque vive na zona rica da cidade,
juntamente com os outros milionários.
quarta-feira, 14 de julho de 2021
Transferências Imaginárias
Durante aquele
curto período do ano em que não há futebol, assistimos à maravilhosa incursão
dos jornais desportivos na literatura de fantasia. Como nestes diários só se
fala de futebol, e não há futebol, é preciso inventar futebol. Os mais
conservadores transferem os melhores jogadores da época passada para os
suspeitos do costume, os mais arrojados procuram as estrelas em fim de contrato
para anunciar a sua iminente contratação por parte de Porto ou Benfica.
Quando passa
tempo suficiente sem um desenlace no negócio imaginário, os jornalistas e os
seus amigos comentadores apelidam a sua criação de novela. Diga-se aqui, que
algumas novelas são baseadas em histórias verídicas e umas até têm finais
felizes, mas o que aborrece é que, aqueles que anunciam estar em posse de
informações confidenciais, não parecem ter mais sucesso que os outros a
adivinhar o final da novela. Às vezes acertam, mas eu também vou acertar no
Euromilhões quando me dedicar a jogar todas as 139 838 160 combinações
possíveis.
Não há dúvida
que os “especialistas” do futebol são mesmo exaustivos nas suas análises.
Dizem-nos qual será o salário bruto e o líquido, se forem muito minuciosos – e
são – ainda nos dizem de que forma os jogadores poderão poupar nos impostos.
Ninguém se sente à vontade para dizer quanto é que ganha, mas para falar do
salário dos outros não faltam candidatos.
Para quem não
gosta da versão escrita das novelas do mercado de transferências, há a versão
para televisão, que normalmente passa ao fim da tarde nos canais de notícias.
Aí os adeptos mais entusiasmados podem ver o seu clube comprar e vender
jogadores a ritmo de sapateado. Já aconteceu de um jogador (Lucas Veríssimo)
assinar primeiro pelo Benfica, depois estar quase certo no Porto, voltando a
ser jogador do Benfica.
Esperemos que o futebol volte depressa porque o meu coração não aguenta tanta emoção!
terça-feira, 13 de julho de 2021
ANTIGAMENTE NÃO ERA NADA DISTO
Desde a espécie
humana aprendeu a comunicar que as gerações mais velhas se ocupam, para bem do
seu ego, a explicar àqueles que as sucedem que no seu tempo é que era bom. Todos
os motivos são bons para ditar a sentença, seja a falta de reverência de um
jovem perante o ancião que quer furar a fila do pão, seja o corriqueiro passeio
de dois homens de mão dada.
Pois a mim
parece-me que nunca, em tempo algum, existiu esse lugar onde são todos
irrepreensivelmente bem-educados, estritamente heterossexuais e muitíssimo
castos.
Penso que não é
segredo para ninguém que na antiguidade a prostituição, a homossexualidade, a
poligamia e, às vezes, até o incesto era relativamente bem aceite, dependendo
dos lugares, claro. O que pode ser mais surpreendente, para alguns, é que na
Idade Média isso também era comum e bem aceite: a Lisboa de 1147 era descrita
como lugar de liberdade religiosa e de costumes, lugar onde acorriam os homens
mais depravados, “viveiro de toda a licenciosidade e imundície”[1].
Na sociedade andaluz da mesma época também se recusava a castidade, assim como
eram toleradas as relações extraconjugais e a homossexualidade. A poligamia e a
concubinagem predominavam no seio da aristocracia. Não faltavam poemas de
louvor às donzelas, nem aos copeiros que serviam vinho nos banquetes e orgias.[2]
No cristão
Portugal do século XIV, o sexo antes do casamento era a regra e, melhor que
isso, eram os casamentos a furto (que mais não eram que uniões de facto).
Apesar da igreja condenar a prática, acabava por se ver obrigada a validar as
uniões, sob pena de perda de fiéis. Para Oliveira Marques, a Idade Média será a
época mais fecunda de sempre em adultérios, mesmo que estes fossem severamente
punidos pela lei.[3]
Dentro da
hipocrisia geral da época, a prostituição era não só tolerada como até legal.
“Por vezes, as leis do tempo distinguem as «mancebas
solteiras» das «putas caladas»: as primeiras seriam as que viviam e trabalhavam
em bordéis, nas ruas ou nos bairros de prostituição, as segundas talvez as que
iam a casa ou recebiam em sua casa, de modo um pouco mais clandestino. […]
As prostitutas eram marginais? Se só puder responder
sim ou não, respondo convictamente que não. A prostituição não era proibida.
Costuma dizer-se que era tolerada. Eu iria mais longe: era aceite e até
tributada. Uma lei de D. Dinis ordena «que daqui em diante que nom levassem das
putas o soldo assi como suiam [costumam] levar»; e as prostitutas que fossem
trabalhar para a feira da Guarda, pelo S. João, deveriam pagar dois soldos ou
um par de pássaros. Uma ocupação fiscalmente tributada é uma ocupação legal e
admitida.”[4]
Para quem ainda
não esteja totalmente convencido que dantes era exatamente como agora,
aconselho a leitura do curto artigo de Isabel Drummond Braga: “Ser
Travesti em Portugal no século XVI”. Nele podemos ver o caso de uma mulher
que, de noite, se vestiu de homem e de um homem que, na véspera de Natal, se
vestiu de mulher. Ambos foram condenados a multas de dois ou três mil réis.
Para casos mais
recentes podem perguntar aos vossos avós, mas eles vão dizer: “Antigamente não
havia nada disso”.
Duarte, L.
M. (2011). Marginalidade e Marginais. Em J. (. Mattoso, História da Vida
Privada em Portugal - A Idade Média (pp. 170-196). Porto: Temas e
Debates.
Marques, J. S. (1987). Nova História de Portugal
- Portugal na Crise dos Século XIV e XV. Lisboa: Presença.
Marques, J. S. (1993). Nova História de Portugal - Portugal das Invasões Germânicas à "Reconquista". Lisboa: Presença.
PORTUGAL NÃO É RACISTA
Não há ninguém em
Portugal que nunca tenha ouvido esta frase, ou variantes da mesma. Afinal de
contas, fomos o primeiro país do mundo a abolir a escravatura, não é? Não, não
é bem isso. Em 1761 é emitido um alvará que declara livres todos os escravos
que chegassem a Portugal, mas não liberta os escravos que já estavam no
território nem os filhos que estes pudessem vir a ter. Além disso, nas colónias
a escravatura continuou pujante por muito tempo, sendo abolida apenas em 1869,
62 anos depois da Inglaterra. E para provar a simpatia do povo lusitano
enquanto colonizador, mantivemos os trabalhos forçados nas colónias até ao ano
da graça de 1961. Realmente, a nossa colonização era mesmo boazinha, somos uns
heróis dos direitos humanos.
“Quer dizer, pode haver
algum racismo, mas não é nada como nos Estados Unidos”. Nos Estados Unidos
discute-se o racismo e combate-se o racismo, parece-me que ao reconhecer a sua
existência eles estão um passo à nossa frente. Talvez seja esse o problema: o
povo português tem poucas oportunidades de expressar o seu racismo, há poucos
negros em Portugal e vivem sobretudo na grande Lisboa. O resto do país tem de
se entreter a inventar histórias sobre chineses canibais, sobre ciganos ladrões
e pouco mais. No início do milénio ainda houve a esperança de se poder odiar os
ucranianos – mais escolarizados que nós –, mas parece que esses mudaram de
ideias em relação a vir para Portugal (o assassinato de Ihor Homeniuk – que
obviamente é um caso isolado porque, na maioria dos casos, os espancamentos não
resultam em morte – só veio confirmar que é melhor escolher outro destino). Depois
houve a hipótese de desprezar os refugiados sírios, mas eles preferiram ir para
a Alemanha. Contudo sinto que agora temos uma nova oportunidade com os
emigrantes brasileiros, sinto que esses serão perfeitos para nós. Parece que
estão um pouco por todo o país e nós já temos rótulos prontos para eles: os
homens são preguiçosos e as mulheres dissolutas.
Se calhar, é por haver tão pouco racismo em Portugal que nos dedicamos a pesquisar os casos estrangeiros. Se calhar é por isso que há tanto interesse no cadastro de George Floyd.
O raciocínio é simples
de deduzir: “este preto também não devia ser flor que se cheire”. Claro, morre
uma pessoa e vamos logo verificar o seu cadastro, a ver se ela merecia estar cá
a consumir oxigénio. Seria assim se fosse branco? Não sei dizer porque a
polícia não costuma matar brancos.
É curioso que Ihor Homeniuk não tenha suscitado o mesmo interesse de Floyd.
Se calhar é porque o
nome é difícil de escrever. Pronto, é compreensível também ninguém vai agora
aprender uma língua nova só para acompanhar um caso que devia envergonhar todos
os portugueses.
Para terminar, não que
o assunto esteja encerrado, ninguém acha, nem que seja ligeiramente, estranho
que existam tão poucos deputados não brancos na AR? Há quase meio século que
não somos racistas e só tivemos 9 deputados não brancos? Poderíamos fazer o
mesmo tipo de observações para as universidades, para a televisão, para as
redações dos jornais ou para os quadros de topo das principais empresas
portuguesas. Podíamos fazer observações por declaração de rendimentos e por
tipo de habitação (aqui se o INE tivesse colaborado com uma pergunta sobre
etnia nos censos, seria mais fácil). Podíamos fazer tudo isso para no fim fazer
de novo a pergunta: Portugal não é racista?
Pobres
Eu não tenho nada contra pobres, até tenho amigos que são. O que eu não gosto é de os ver a contar os tostões para pagar a conta do sup...
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